Branco. Preto. Imagens. Leveza.
Um menininho e um teatro de marionetes.
Deslumbramento e ternura - as sensações despertadas pela leitura deste livro de imagens. De imagens e emoções.
Antes de continuar: observe primeiro algumas imagens, clicando aqui (primeiro capítulo disponível no site da Livraria Cultura).
Vistas as imagens... Na primeira leitura que fiz do livro (sim, leitura), desta história criada pela artista belga chamada Gabrielle Vincent (pseudônimo de Monique Martin), descobri que não havia entraves lingüísticos (francês? português?) que pudessem tornar difícil a nossa comunicação, o nosso contato, que nos impedissem de compartilhar, como autora e leitora, esta singela história. As imagens falavam sem precisar de palavras.
Mas, há sempre quem se pergunte: como ler um livro sem palavras? Lembro então das palavras de Alberto Manguel em Uma história da leitura (Cia. das Letras, p. 19-20):
"Ler as letras de uma página é apenas um de seus muitos disfarces. O astrônomo lendo um mapa de estrelas que não existem mais; o arquiteto japonês lendo a terra sobre a qual será erguida uma casa, de modo a protegê-la das forças malignas; o zoólogo lendo os rastros de animais na floresta; o jogador lendo os gestos do parceiro antes de jogar a carta vencedora; a dançarina lendo as notações do coreógrafo e o público lendo os movimentos da dançarina no palco; o tecelão lendo o desenho intrincado de um tapete sendo tecido; o organista lendo várias linhas musicais simultâneas orquestradas na página [...] todos eles compartilham com os leitores de livros a arte de decifrar e traduzir signos. [...] Todos lemos a nós e ao mundo à nossa volta para vislumbrar o que somos e onde estamos. Lemos para compreender, ou para começar a compreender. Não podemos deixar de ler. Ler, quase como respirar; é nossa função essencial."
Aprender a ler as imagens, a observá-las, reparar em cada detalhe, tentar deixar-se levar pelo traço... é isso que tenho tentado aprender - ler, sentir, onde não há palavras também. Ainda que agora precise de todas elas para tentar descrever essa obra.
Melhor do que as palavras, contudo, é pegar o livro na mão e experimentá-lo. Reluto até em tentar descrever a sua linha narrativa...
A espontaneidade e a suavidade do traço da artista realmente encantam. Encontrei um trecho de um depoimento dela, em francês, que mostra um pouco de como era sua experiência, como ela criava os desenhos (abaixo segue o texto em francês e uma tentativa de tradução para o português):
«[...] Les histoires que je dessine sont souvent des histoires vécues ou observées. J’en ai le scénario dans la tête, et lorsque je prends le crayon, puis la plume, tout vient très vite. Je dessine un peu comme une somnambule, comme si ce n’était pas moi. D’où, sans doute, cette façon que j’ai d’être le spectateur de moi-même, de ne pas arriver à me prendre au sérieux. Presque toujours, c’est le premier croquis qui est le bon, j’aime la spontanéité.» (texto extraído do site da Casterman)
"[...] As histórias que desenho são geralmente histórias vividas ou observadas. Tendo o cenário em mente, e assim que pego o lápis, depois a pena, tudo vem muito rápido. Desenho um pouco como uma sonâmbula, como se não fosse eu. De onde, sem dúvida, este jeito que tenho de ser o expectador de mim mesma, de não chegar a me levar a sério. Quase sempre, é o primeiro esboço que fica bom, eu amo a espontaneidade."
E, para além das sugestões de atividades com as crianças que aparecem no final dessa edição lida, imagino que a primeira delas deveria ser colocar o livro nas mãos da criança... sem falar muito... sem palavras... e observar suas reações, deixá-la saborear as imagens sem muita intervenção.
Para descrever este livro, as palavras me traem e, ao mesmo tempo, são meu instrumento.
Um livro, imagens-poesia. Lindo.
Outros dados da obra:
Título original: La petite marionnette
Autora: Gabrielle Vincent (pseudônimo de: Monique Martin - 1928-2000)
São Paulo, Editora 34, 2007, 84p.
Arte: é possível ver um pouco do trabalho da autora nas páginas que estão disponíveis no site Amazon para outra obra dela - Um dia, um cachorro, clicando aqui.
2 comentários:
A arte de desenho e pintura é realmente impressionante. Essa artista tem a sensibilidade de descrever em suas obras os sentimentos que brotam do seu ser.
Um abraço
Olá, Francisco
tudo bom?
Certamente - é uma artista impressionante. Cada dia mais me encanto com esse mundo repleto de sensibilidades.
Fote abraço.
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